O Homo Sapiens Sapiens, o Ridículo, o Burnout e o Pecado

O Homo Sapiens Sapiens, o Ridículo, o Burnout e o Pecado

Os portugueses estão a adoecer a trabalhar, para manter níveis de desempenho impossíveis, que não se coadunam com os padrões de saúde preconizados pela Organização Mundial de Saúde.

O Homo Sapiens Sapiens, o Ridículo, o Burnout e o Pecado

Os portugueses estão a adoecer a trabalhar, para manter níveis de desempenho impossíveis, que não se coadunam com os padrões de saúde preconizados pela Organização Mundial de Saúde.

O Homo Sapiens Sapiens como “super-herói”. Acreditem que é um conceito que “vende ou pelo menos tem vendido bem”! Mas, desafiar as pessoas que já se encontram debaixo de água a continuar a desenvolver competências-chave para o futuro durante as férias, no limite, parece-me obsceno! Ou, sugerirem o top ten dos livros mais relevantes sobre a área para ler na praia durante as férias? Ou, escutar no caminho para o parque aquático os podcast mais ouvidos sobre determinado tema “muito importante” no momento de descanso? Tudo isto, roça o ridículo. Alias, permitam-me citar Yuval Noah Harari que admiro, “a natureza do homem não foi concebida para o trabalho, mas sim para o ócio” e, para além disso “o trabalho é uma construção social, tal como o dinheiro”.

 

E, que tal parar? Porque, precisamos de um período de recuperação, um break, um momento de ócio que é tão merecido de “dolce far niente”. Não vos pareça mal, mas julgo que esta pretensão faz cada vez mais sentido porque estamos a adoecer a trabalhar, para manter níveis de desempenho impossíveis que não se coadunam com os níveis de saúde preconizados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Entenda-se saúde, como um estado de bem-estar físico e mental exibido pelos indivíduos de forma integrada (OMS, 2023). O estudo realizado pelo Laboratório Português dos Ambientes de Trabalho Saudáveis (2023), identifica níveis elevados de risco em termos de saúde mental com 80% dos trabalhadores a apresentarem pelo menos um sintoma de Burnout (amostra composta por 2000 profissionais alocados aos vários setores de atividades nacionais). O último estudo desenvolvido pela MERCER no período de 2022/2023, com uma amostra de 13 mil executivos diz que 81% dos trabalhadores se sente em risco de Burnout, devido ao stress e ao trabalho excessivo.  A Ordem dos Psicólogos Portugueses em 2022 no seu relatório do Custo do Stress e dos Problemas de Saúde Psicológica no Trabalho diz que 53% dos trabalhadores faltaram ao trabalho por Burnout, 60% por exaustão física, 96% sentem o seu dia-a-dia afetado e 57% sentem exaustão. Estamos a falar de dados relativos aos trabalhadores portugueses, que neste caso em específico, somos todos nós!

 

Posto isto, não me quero focar apenas no esforço físico, emocional e cognitivo que despendemos nas intermináveis horas que investimos a trabalhar, mas não posso deixar de focar alguns dos fatores que consomem muita energia “boa” no dia-a-dia. Estes fatores ocorrem em diferentes dimensões, nomeadamente: 1) o esforço sistemático de atualização constante que nos é imposto por força das novas tecnologias, 2) as múltiplas reuniões presencias ou via plataformas digitais em que participamos e que nos retiram tempo de recuperação e de reflexão necessários (são verdadeiras maratonas), 3) as intermináveis horas de trabalho suplementar (funções mal calibradas), 4) a falta de períodos de tempo de recuperação, 5) o elevado numero de horas perdidas em deslocações para o trabalho (ou vice-versa), 6) os múltiplos papeis que assumimos dentro da organização e 7) a qualidade das relações entre chefias e colegas de trabalho.

Este lado da moeda, absorve tanto da nossa energia e da nossa capacidade enquanto indivíduos que o nosso lado pessoal fica descurado. Para adensar, vivemos um período marcado por um contexto económico exigente com uma a inflação desmesurada, com as taxas de juro a aumentar, com a perda de poder de compra e de qualidade de vida. Se, tivevesse de descrever este momento recorrendo a uma metáfora diria que estamos a viver uma “perfect storm”, porque o alinhamento é de facto perfeito, temos todos os ingredientes que servem de rastilho para as múltiplas convulsões sociais e políticas que já começámos a experienciar.

 

A fatura é muito pesada, pois sentimo-nos culpados por não ter a capacidade de encaixe e a paciência que gostaríamos para a família, para os amigos e para as nossas relações pessoais. Abdicamos dos nossos períodos de lazer, não temos a oportunidade de estarmos a sós com o “nosso eu” e de refletir sobre as nossas opções e os caminhos a seguir. Como resultado desta miríade de responsabilidades e preocupações entendo que merecemos todos nós, o tão desejado descanso, as férias.  Quero sentir-me bem e sem pressão, quero brincar com os meus filhos, quero correr pela praia, quero cantar, quero ter disponibilidade para praticar desporto, quero fazer piqueniques, quero passear a pé, quero ler apenas os livros que me apetecer, ou talvez quem sabe, “não pensar, apenas”.   Adoro ditados populares: “depois da tempestade vem a bonança”, mesmo que seja por um curto período vamos usufruir dela!

 

Em suma, quero viver o “agora”, quero construir memórias, quero ter saúde e sentir-me bem! Não quero compactuar mais com a ditadura do “fica bem”! Vamos aproveitar as férias, vamos fazer apenas o que nos faz bem e, nos faz sentir revigorados e felizes! Não é pecado ser feliz!

 

Daniela Lima, Managing Partner da Swaifor

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